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O acendedor de lampiões

A China, país amigo ou novo explorador de Moçambique?

2 Juin 2017 , Rédigé par David Brites Publié dans #Moçambique, #Economia

A China é um dos maiores países investidores em Moçambique. Claro, os investimentos chineses em África caíram de 40% em 2015, no entanto, ainda são muitos importantes, em competição direta com os investimentos europeus, e muitos maiores aos dos Estados-Unidos. Desde o início dos anos 2000, o chefe do Estado e o Primeiro ministro chineses, acompanhados por representantes de empresas chinesas, já fizeram umas 4 ou 5 visitas no continente africano, fazendo cada vez uma verdadeira turnê diplomática. Só em 2010, o comércio entre Moçambique e a China atingiu uns 690 milhões de dólares; as importações vindo da China para Moçambique atingiram 496 milhões de dólares e suas exportações em direção da China chegaram a 210 milhões de dólares. Governo e sociedade civil em Moçambique têm um olhar diferente do papel da China no país, e isto revela uma visão crítica sobre os laços entre as elites políticas e económicas nacionais com os investidores chineses.

Um olhar sobre o papel assumido pela China em Moçambique hoje em dia. No desenvolvimento do país como na exploração dos recursos.

Enquanto os Ocidentais estão olhando pela Ásia, a Ásia esta olhando pela África, e tece com ela relações que confirmam a multi-polarização do mundo. Pensa-se principalmente na China, a qual assina acordos com um número crescente de países africanos – acordos muito criticados. É preciso lembrar, antes de tudo, que a China não é a única a negociar com países africanos, diretamente ou através grandes empresas. Por exemplo em 2008, num contexto de crise alimentar, Daewoo Logistics negociou com o governo de Madagascar a locação por 99 anos de um milhão e meio de hectares de terras agrícolas. Objetivo: produzir milho e óleo de palma, com destino a Coreia do Sul, que visa garantir a sua segurança alimentar. Se a instabilidade política no Madagascar acabaram com este projeto da Coreia do Sul, o projeto ilustrou a dependência agrícola crescente que leva alguns países da Ásia e do Meio-Oriente em relação às terras na África sub-sahariana.

A China, que tem 9% de terra arável do mundo, enquanto tem cerca de 20% da população mundial, também faz parte dos que querem as terras africanas. No entanto, é sobretudo as matérias-primas – petróleo, mas também cobre, aluminium, cobalto, metais ferrosos – e as oportunidades de negócios para seus produtos que incitaram a China a fortalecer as suas relações com a África desde o início dos anos 2000. Essa relação da « chináfrica », por seu caráter geo-estratégico, preocupa as nações ocidentais. A China tornou-se um importador líquido de petróleo em 2003, e decidiu então ir em África para suas fontes de alimentação. Hoje, um terço do seu petróleo vem deste continente. Os hidrocarbonetos representam 72% e os metais 14% do total das importações da China provenientes da África. Em cinco anos (do início de 2003 até o final de 2007), o comércio sino-africano cresceu de 294% e chegou a 106 bilhões de dólares em 2008, contra 55 em 2006.

Estas progressões são impressionantes, mas na verdade, a participação da China no comércio africano não é tão alto como a gente imagina: apenas 10,3% das exportações africanas tinham, em 2009, como destino a China, contra 40% a União europeia; a proporção da China nas importações africanas foi de 10% em 2007, ainda muito longe da União europeia (38,5%). Finalmente, o continente africano representava apenas 4,1% do comércio da China em 2008 e, todavia, os investimentos chineses em África continuaram a ser relativamente pequenos em comparação com os dos Europeus ou Americanos. Então, porquê as relações sino-africanas despertam reações e condenações das nações ocidentais e até mesmo na África? Os críticos não são sobre a influência comercial real da China, mas sobretudo sobre os métodos que utiliza Beijing para estabelecer a presença em África. Porque ela não limita-se a comprar matérias-primas e vender seus produtos: os Chineses investem, instalam-se, e também exportam uma mão-de-obra que não acha localmente – em outras palavras, « colonizam », denunciam os Ocidentais e alguns Africanos.

Jornal O País - 12-10-2016.

A China em África: uma nova realidade que não agrada os Ocidentais

A presença da China em África irrita as posições e os interesses estabelecidos: os dos Estados-Unidos, em particular no setor do petróleo (por exemplo, em 2008, os Estados-Unidos foram destinatários de 44% das exportações de petróleo da Nigéria, e no âmbito do African Growth and Opportunity Act, votado em 2000 pelo Congresso americano, os produtos de petróleo representam 92,3% das exportações da África em direção dos Estados-Unidos); e os das antigas potências coloniais que têm dificuldades a sair das relações ambíguas instauradas desde a descolonização.

A Europa e os Estados-Unidos criticam a China por ter assinado acordos de assistência com 48 países africanos (sobre 57) e acordos de crédito com taxas preferenciais com 20 países sem ter pedido reformas em termos de democracia ou governação. É verdade, muito longe das normas consensuais de Washington, a única coisa exigida por Beijing aos seus parceiros africanos, é de não ter relações com Taiwan... A China não dá muita importância às considerações políticas sobre as modalidades de chegada ou de permanência ao poder dos governos africanos. Além disso, as empresas chineses que estão presentes em África são criticadas com freqüência sobre o não-respeito das normas de higiene e segurança nas minas, nas fábricas e nas obras de construção, ou sobre as práticas de dumping social que as permitam, com uma mão-de-obra imigrante chinesa, vencer os concursos iniciados pelos Estados para assumir grandes projetos de infra-estruturas.

Estes fatos são denunciados pelos mídias, afectam consideravelmente a reputação da China em África, e certos países, por exemplo a África do Sul ou a Zámbia, exprimam desde alguns anos uma certa hostilidade com investidores chineses. Outros tentam fazer um balanço interessado na concorrência entre a China e a Índia. New-Delhi, também a procura de minas e hidrocarbonetos, também investe muito em África. Uma abordagem conhecida por ser menos brutal que a da China, uma lógica de cooperação integrando mais a transferência de tecnologia e um certo cuidado com problemáticas de desenvolvimento local – umas famas que é preciso relativizar muito... – permitam às grandes empresas indianas de marcar pontos significativos além das suas atividades extrativas. É o caso no setor automóvel com Mahindra e Tata Motors, farmacêutico com Cipla ( a Índia é também o primeiro fornecedor de moléculas genéricas em África, onde os laboratórios europeus são pouco presentes porque acham que são dá lucro suficiente), mas também nas telecomunicações, na hotelaria, ou até mesmo no transporte ferroviário onde, à alguns anos, ninguém ainda imaginava os Indianos. New-Delhi fez deste continente uma das suas prioridades, no entanto a desenvolvimento das relações entre Índia e África é principalmente o fato de empresas privadas (Jindal em Moçambique por exemplo, a explorar carvão), ao contrário da China, cujos investimentos são sempre públicos e negociados entre Estados.

Esta presência chinesa continua crescendo. 2017 é a primeira destinação do ministro dos Negócios estrangeiros chinês. Logo em Janeiro deste ano, Wang Yi visitou Madagascar, a Zambia, a Tanzânia, o Congo e o Nigéria. E muitos Áfricanos consideram estes envolvimentos como uma sorte e uma oportunidade. Em Janeiro de 2017 por exemplo, foi oficialmente estimado que, na Tanzânia, umas 200 fábricas serão implementadas no país com o apoio da China nos próximos três anos, ou seja, uns 200.000 empregos, com base um plano ambicioso destinado a tornar a Tanzania um país industrializado. Um plano que inscreva-se na continuidade do 6° Forum da cooperação China-África (FOCAC) que foi realizado em 2015 em Johannesburg (África do Sul); naquele encontro, a Tanzânia foi escolhido, com a Etiópia, o Kenya e a África do Sul para beneficiar do apoio da China na sua industrialização. Na Tanzânia, a China já investa muito em várias setores como nos caminhos de ferro, nas estradas ou no portuário.

Entre Moçambique e a China, uns 8.000 kilómetros de distância em linha recta.

Entre Moçambique e a China, uns 8.000 kilómetros de distância em linha recta.

Investimentos de infra-estruturas e exploração dos recursos

A terra de Moçambique atraia muitos empresários ambiciosos, como muitas empresas estrangeiras, sul-africanas, portuguesas, australianas, norte-americanas, indianas, e claro, chinesas. As empresas ocidentais, asiáticas ou sul-africanas jà estão a operar, sobretudo nas províncias do Norte e do Centro do País. Se os Chineses não exploram os hidrocarbonetos, no entanto eles se especializaram em duas áreas. Primeira área onde os Chineses tornaram-se « mestres »: a construção de projetos de infra-estruturas, como pontes, estradas, ou ainda ou aeroportos.

Os dois desses projetos mais famosos são os seguintes: 1) a via circular em volta do Grande Maputo (um projeto assumido por um custo de 300 milhões de euros), e que tem por objetivo o descongestionamento das estradas da capital moçambicana e a sua adaptação frente ao crescimento considerável do parque automóvel dos Moçambicanos morrendo na aglomeração; e 2) a ponte entre Maputo e Catembe, pequena cidade à frente da capital, do outro lado do estuário (725 milhões de dólares). Para ir mais longe sobre os projetos de construção e de investimentos estrangeiros em Moçambique: Mega-projetos e industrias extrativas: em Moçambique, o crescimento económico não assegura o desenvolvimento. A área militar também conhece uma implicação crescente da China. Em 19 de Maio de 2016, Rádio Moçambique explicava que « a China vai apoiar Moçambique na defesa nacional, indústria e inteligência do Estado na área de segurança e ordem pública »... um notícia que dava para surpreender, logo depois de vários escândalos ligados à defesa nacional – Ematum, Pro-Indicus, Mam (Mozambique Asset Management), etc.– que criaram uma dívida impressionante e colocaram Moçambique numa posição financeira bem complicada.

Segunda área onde os Chineses intervêm muito: na exploração de matérias primas, em particular a areia pesada e a madeira. Por exemplo, a empresa chinesa Hayiu Mining Company está há alguns anos explorando a areia pesada de Sangage, no distrito de Angoche (província de Nampula). A exploração das florestas moçambicanas é a outra grande « obra » chinesa neste país. É difícil avaliar o nível exato de exploração florestal pelos Chineses em Moçambique, porque a madeira registrada à exportação de Moçambique não atinge o mesmo valor que a madeira registrada à importação na China, o que supõe uma grande parte de madeira explorada de maneira ilegal.

Por exemplo, dados da ONU Comtrade, compilados pelo World Resources Institute em 2016, mostram uma discrepância de 300 milhões de dólares entre o valor de madeira que é declarado para exportação de Moçambique (100 milhões de dólares) e a que, de fato, entra na China (400 milhões de dólares). Esta diferença está crescendo: a madeira moçambicana entrando na Chine ainda era inferior a 90 milhões de dólares em 2009, o valor da madeira moçambicana entrando na China quase duplicou de 2013 a 2014. Então só sabemos que o nível de exploração de madeira é enorme, mas o valor exato não é conhecido, e como poderemos o ver mais longe neste artigo, esta situação tem consequências: 1) fiscais, o que supõe ume certa situação de exploração de Moçambique por empreendedores chineses, apoiados por cidadãos e funcionários corruptos; e 2) ambientais, de muito mais longo-prazo.

Costa do Sol, em Maputo. Tal como o projeto de ponte Maputo-Catembe (725 milhões de dólares), o novo anel viário de Maputo, que passa parcialmente por Costa do Sol, é uma operação de construção típica do Moçambique atual, sobrefaturada (300 milhões de dólares) e assumida por construtores chineses. O objetivo é o decongestionamento da capital moçambicana, e a sua adaptação frente ao crescimento considerável do parque automóvel dos Moçambicanos morendo na aglomeração.

Costa do Sol, em Maputo. Tal como o projeto de ponte Maputo-Catembe (725 milhões de dólares), o novo anel viário de Maputo, que passa parcialmente por Costa do Sol, é uma operação de construção típica do Moçambique atual, sobrefaturada (300 milhões de dólares) e assumida por construtores chineses. O objetivo é o decongestionamento da capital moçambicana, e a sua adaptação frente ao crescimento considerável do parque automóvel dos Moçambicanos morendo na aglomeração.

Uma relação desequilibrada na qual os Moçambicanos são os grandes perdedores

É com a cumplicidade de uma administração corrupta que grandes proprietários e investidores confiscam terras de pequenos agricultures para produzir principalmente para exportação, ou que empresas estrangeiras, incluindo chinesas, atribuam-se espaços para os explorar, e explorar as matérias-primas que estão lá. As empresas estrangeiras, gradualmente, colocam seus peões na vasta cena econômica moçambicana. Somente em 2014, os investimentos chineses atingiram 3,62 bilhões de dólares, em muitas áreas: agricultura, comunicações, carros, construção, hotéis, etc.

Mas os mega-projetos continuam sem beneficiar realmente aos próprios moçambicanos. O Centro de Integridade Pública (CIP), uma instituição independente, chama regularmente, com outras organizações da sociedade civil, o executivo a rever os incentivos fiscais que existem ainda e que favorecem as empresas internacionais, principalmente porque a contribuição destas mesmas para o imposto continua a ser extremamente baixo. Uma chamada em vão.

Por exemplo, o Estado moçambicano perdeu, entre 2012 e 2015, cerca de 13 milhões de dólares de impostos, que a empresa chinesa Hayiu Mining Company deveria ter pago, pela exploração de areia pesada no distrito de Angoche, já mencionada mais cedo neste artigo. Em vez disso, a Hayiu Mining Company apenas canalizou 60.000 meticais, ou seja, menos de 2.000 dólares. Além disso, esta empresa chinesa não respeita as obrigações sociais impostas pelo Código do trabalho moçambicano, mandando fora, por exemplo, qualquer mulher que fica grávida. E o governo distrital de Angoche faz tudo para esconder estas práticas ilegais, o que deixa a pensar que há atrás disso tudo um caso de corrupção com as autoridades locais. « Jà estive nessa companhia e conversei com alguns jovens funcionários, conta Gilda Homo, encarregada de projetos na associação kuwuka Jda. As condições são realmente desumanas, para além da degradação do ambiente, uma vez que a Haiyu Mining faz uma a exploração quase artesanal de areias pesadas naquela área. » Um caso emblemático do Moçambique, onde as grandes empresas estrangeiras podem agir em total impunidade.

As zonas do país mais afectadas pela deflorestação.

Falta fiscal aparece também com a exploração florestal. A Universidade Eduardo Mondlane acabou em 2015 um relatório, financiado pela União europeia, que estima que o tráfico de madeira aumentou de 88% entre 2007 e 2011; a quantidade de madeira ultrapassa então claramente os quotas oficiais, por isso as autoridades fizeram de tudo para impedir este estudo de ser realizado e depois publicado. Os dois terços, talvez até os três quartos das exportações seriam feitas de maneira ilegal. E um nível sobre-elevado de quotas são autorizados ás empresas florestais, o que representa uma falta fiscal enorme, que pode atingir 10 ou 11 milhões de dólares (segundo esse estudo); a este valor deve-se acrescentar 10 milhões de dollars de perca a mais, porque as exportações legais são sistematicamente subestimadas, no objectivo de favorecer os exportadores ao nível fiscal. Para ir mais longe sobre a questão da exploração dos recursos naturais e a destruição do meio ambiente em Moçambique: A exploração do meio ambiente: ou como Moçambique está perdendo suas riquezas naturais. Aqui são representados as zonas do território moçambicano mais afectadas pelo desmatamento.

De novo em 2012, um relatório publicado pelo Centro para a pesquisa florestal internacional (CIFOR) sublinhou o fato que, para 30 milhões de dólares de exportação de madeira registrada em 2009 pela alfândega moçambicana com destino a China, as estatísticas chinesas de 2010 notaram uma importação de madeira moçambicana equivalente a 134 milhões de dólares. « Se as estatísticas chinesas são certas, podemos ler no tal relatório, a diferença é atribuível a deficiências dos controlos aduaneiros, o que significa que Moçambique subiu uma perca considerável em termos de benefícios fiscais. » Um outro estudo, realizado desta vez pela Agência Britânica de investigação, e publicada em 2014, revelava que 93% da exportação de madeira moçambicana em direção da China era efetuada ilegalmente. A exportação ilegal de madeira fez perder desde 2007 uns 108 milhões de euros de taxas ao Estado moçambicano, acrescenta a Agência britânica, que supõe que esta atividade criminal é aproveitado por responsáveis importantes do governo moçambicano. De fato, as taxas da exploração agroflorestal não são reafetadas às populações locais. Um vasto sistema caracterizado pela corrupção a todos os níveis (moradores, alfândega, serviços administrativos, etc.) estabeleceu-se – o trafic de madeira é um dos mais importantes do mundo – e ameaça claramente o ecosistema moçambicano. Grande falta fiscal, então, e uma exploração florestal que não se acompanha de compensações para as comunidades afetadas ou em termos de reflorestação.

Outro problema financeiro considerável que aparecem nas relações opacas entre Moçambique e China: que nem o Aeroporto Internacional de Nacala, na província de Nampula, inaugurado em 13 de Dezembro de 2014, muitos concursos para projectos de infra-estruturas são vencidas por empresas de construção chinesas, e são quase sempre o resultado de negociações opacas cuja seleção faz-se com um « refresco » ou uma « comissão » cuidadosamente colocada para satisfazer os políticos. Resultado: Moçambique tem projectos sobre-facturados para necessidades igualmente sobre-estimados, especialmente com a China. É o caso do Aeroporto de Nacala, construída por uma empresa brasileira; mas também dos dois projetos do Grande Maputo que já foram enunciados mais cedo, e cuja fase de construção é assumida pelos Chineses, ou seja, a ponte Maputo-Catembe, cujo custo de 725 milhões de dólares é demasiado elevado para um projeto deste tipo; e novo anel viário de Maputo (300 milhões de dólares), que deve permitir aliviar um pouco o tráfico nas estradas da capital.

O impacto não é só financeiro, é também social, porque estes projetos, muitas vezes, fazem-se sem consulta com as populações locais. Por exemplo, o projeto de ponte Maputo-Catembe vai impactar de maneira determinante o futuro de Catembe e mais geralmente do distrito de Matutuine, das suas comunidades e do seu ecosistema. Não é o papel dos Chineses de cuidar do bem-estar e da vontade dos cidadãos moçambicanos, isto é papel do Estado, entidade pública que representa a soberania popular. Mas o governo moçambicano não é representativo das vontades do povo, e, pela corrupção, a China e os seus investimentos participam a agravar esta situação de desconexão entre os dirigentes moçambicanos e as comunidades.

Grande complexo de exploração de areia pesada perto de Icidua, um bairro pobre e periférico de Quelimane (província da Zambézia). Este projecto chinês inclui a construção de um bloco residencial para poderem dormir là os trabalhadores chineses que estão envolvidos no projecto.

Grande complexo de exploração de areia pesada perto de Icidua, um bairro pobre e periférico de Quelimane (província da Zambézia). Este projecto chinês inclui a construção de um bloco residencial para poderem dormir là os trabalhadores chineses que estão envolvidos no projecto.

As consequências estruturais dessa relação desequilibrada

Claro, seria desonesta dizer que a cooperação entre China e Moçambique só faz-se negativamente para Moçambique. O governo espera uma transferência de competência e de tecnologias da China para Moçambique. Por exemplo, quando ele fez uma das suas visitas a Moçambique, em Dezembro de 2007 (era no tempo do primeiro mandato Guebuza), Hu Jintao, então presidente da República chinesa, anunciou que Pequim ia a enviar 10 técnicos e máquinas agrícolas ao longo dos três anos a seguir, e neste âmbito, ele e prometeu dar formação a 100 técnicos agrícolas moçambicanos. No entanto, isso é só a ponta do iceberg, e de várias maneiras, a China tornou-se nestes últimos anos um parceiro cuja relação com Moçambique acabou sendo particularmente perversa. Portanto, a relação não é de igual a igual, e isso é uma realidade acentuada pelo alto nível de corrupção moçambicano, a todos os níveis.

Estes laços comerciais e financeiros cada vez maiores tem por conseqüência uma certa dependência que enfraqueça Moçambique, pois a economia moçambicana sofre de qualquer mudança importante no estar da economia chinês. E já o dissemos, os investimentos chineses em África caíram de 40% em 2015. E no contexto da crise económica moçambicana ligada à queda do metical desde o final de 2015, o abrandamento do crescimento económico chinês tem impacto sobre os investimentos exteriores do país mais povoado do mundo. Aliás, no início do ano, a agência de notícias financeiras Bloombergas previa um ano difícil, explicando, em 27 de janeiro: « [o metical] deve enfraquecer-se novamente este ano [em 2016] por causa do abrandamento chinês e do dólar mais forte. »

Problemas estruturais obviamente não estão sendo resolvidos. Dia 17 de Fevereiro (de 2016), o web-jornal África Monitor publicou um artigo muito crítico sobre as dívidas e clientelas do regime Frelimo, incluídas aquelas ligadas à China, herdadas do mandato Guebuza: « Moçambique triplicou o endividamento entre 2000 e 2015 [...]. Muitos dos gastos estão ligados a projetos de interesse duvidoso e, de acordo com alguns analisas, serviram sobretudo para enriquecer clientelas ligadas à Frelimo. [...] As tarefas de Nyusi são agora cortar gastos, lidar com o FMI e gerir uma elite que "engordou" com a política clientelista dos últimos anos. [...] Os projetos incluem a ponte de Catembe (725 milhões de dólares) e o novo anel viário de Maputo (300 milhões de dólares). Ambas obras promovidas por empresas chinesas. Entretanto, a China já se tornou maior credor de Moçambique. »

Além dos aspetos financeiros e comerciais, uma outra consequência durável é os impactos sofridos pelo meio ambiente e os recursos naturais deste país, frente à exploração estrangeira, especialmente chinesa. A desflorestação é uma das piores consequências da cooperação chinesa em Moçambique, em particular por causa do trafico ilegal, mas não só. A sua exploração provoca a lenta mas constante destruição de imensas zonas florestais nas províncias do centro e do norte do país, em particular as de Sofala, de Zambézia e de Cabo Delgado. Em 2006, o Fórum das ONG da província da Zambézia (FONGZA) publicou um relatório cujo título, explícito, foi reutilizado pela imprensa nacional: « Um take away chinês ! ». Segundo o inventário Florestal Nacional, 0,58% do património florestal de Moçambique, ou seja: 219.000 hectares, desaparece cada ano.

Segundo uma pesquisa publicada em 2013 do l’Environmental Investigation Agency, até altos responsáveis foram ou estão implicados no trafico de madeira, incluídos ministros da Agricultura. O ultimo ministro da presidência Guebuza, José Pacheco, era acusado de deter participações numa sociedade florestal privada, criada na altura da sua nomeação no ministério. De várias maneiras, por atos de corrupção ou por conflitos de interesses enormes, os ministros e mais geralmente os membros da Frelimo participam (e isto foi a característica primeira da presidência Guebuza) á exploração excessiva dos recursos deste país e á confiscação, por formas pseudo-legais diversas, das riquezas criadas. Para ir mais longe sobre este assunto: Moçambique: a hegemonia da Frelimo, um freio à redistribuição das riquezas. Em 1 de Setembro de 2016, o diretor nacional de Florestas do Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, Xavier Sakambuera, informou pelo jornal Notícias que uma proposta de lei tinha sido elaborado pelo governo e entrega ao Parlamento para debate e votação, no sentido de proibir a exportação de madeira em toro; isso significa, de acordo com o matutino, que os inspectores alfandegários deixam de ter de determinar qual a espécie de madeira a ser exportada, atendendo a que de acordo com a lei em vigor as espécies de maior valor têm de ser processadas no país. Lembrando então que Moçambique tem estado a perder 220 mil hectares de floresta por ano (resultado das cortes de árvores mas também dos fogos florestais associados à agricultura ou à remoção de árvores para a construção de edifícios), Sakambuera explicou naquela altura que o executivo espera assim reduzir o abate ilegal de árvores e fomentar a criação de mais postos de trabalho na indústria de processamento de madeira.

Duas gerações de presidentes, para duas décadas de cooperação intensa sino-moçambicana. Na fotografia à esquerda, Armando Emílio Guebuza (2005-2015) em visita em Pequim, em 10 de Agosto de 2011, com o seu homólogo Hu Jintao, que ocupou a carga de chefe do Estado chinês entre 2002 e 2012. À direita, Felipe Jacinto Nyusi encontra Xi jinping, presidente da República popular de China desde 2012, na cimeira China-África de Johannesburg, em 3 de Dezembro de 2015.

Duas gerações de presidentes, para duas décadas de cooperação intensa sino-moçambicana. Na fotografia à esquerda, Armando Emílio Guebuza (2005-2015) em visita em Pequim, em 10 de Agosto de 2011, com o seu homólogo Hu Jintao, que ocupou a carga de chefe do Estado chinês entre 2002 e 2012. À direita, Felipe Jacinto Nyusi encontra Xi jinping, presidente da República popular de China desde 2012, na cimeira China-África de Johannesburg, em 3 de Dezembro de 2015.

É preciso entender que uma melhoria nos controlos da exploração de madeira não se fará pela uma boa-vontade da China: os parceiros chineses não são amigos de Moçambique, eles têm interesses e não se importam da sustentabilidade do modelo econômico moçambicano, aliás, eles aproveitam as fraquezas do sistema moçambicano para melhor o explorar, com custos reduzidos. E isso vale para Moçambique como para toda a África. Em Março de 2013, o governador do Banco central do Nigeria declarou, no Financial Times, na véspera da primeira visita do presidente Xi Jiping no continente africano, que a China « é capaz das mesmas práticas de exploração que as antigas potências coloniais ». No seu livro Moçambique na rota da China. Uma oportunidade para o desenvolvimento? (2010), o economista moçambicano Sergio Chichava acrescentava: « A convergência de interesses entre uma parte da elite moçambicana e as empresas chinesas impede o estabelecimento de relações saudáveis e sustentáveis entre os dois países. A economia e o meio ambiente de Moçambique são as primeiras vitimas deste fenômeno. Esta convergência acentua os riscos ligados à exportação de matérias-primas brutas, que dependem das flutuações do mercado chinês. São relações similares a aquelas que tinham existidas entre África e o Ocidente: elas limitam as perspectivas de desenvolvimento do continente africano. »

Os que continuam a pensar que a África não é um lugar estratégico dum ponto de visto económico enganam-se totalmente. Sempre foi um lugar estratégico, por isso é que os Europeios foram colonizar este continente. A África ainda está longe de ter resolvido os seus inúmeros problemas, no entanto ela está progredindo, e o interesso que têm certos países emergentes – China, Índia mas também Brasil – ilustram o valor dos recursos da África, a estimulam, politicamente como economicamente. O foco mediático sobre a Chináfrica faz esquecer o fato seguinte: quase todas as partes do mundo têm interesses em África – interesses comerciais, políticos e/ou geo-estratégicas. Hoje em dia, são matérias-primas e terras agricolas africanas que atraiam os países industriais e os grandes países emergentes. No futuro, há grande chance de ver o mundo inteiro interessar-se à outra grande riqueza do continente: seus indivíduos. Esta realidade já está em processo!

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